Poder do hábito: o que isso tem a haver com a Odontologia?
Entender os hábitos, como eles funcionam e são estabelecidos em nossas vidas pode nos ajudar a mudá-los, quando necessário. Esse post não é um review do livro “O Poder do Hábito”, de Charles Duhigg, mas tem a proposta de trazer algumas reflexões nele abordadas, que repercutem em nossas vidas e em nossa prática profissional, incluindo a Odontologia.
Como dizia o escritor Charles Dickens: “o homem é um animal de hábitos”. Quando esses hábitos são estabelecidos, o cérebro para de tomar decisões, incorporando, assim, uma série de rotinas. Isso acontece quando conseguimos, por exemplo, dirigir um carro, abrir uma porta, amarrar o sapato, ligar o computador e realizar outras tantas tarefas. Se não tivéssemos a habilidade de construir hábitos, o nosso cérebro ficaria sobrecarregado de informações. Quando voltamos de férias, por exemplo, mesmo tendo ficado vários dias sem dirigir, não precisamos usar todas as habilidades cognitivas que temos para reaprender a conduzir um carro. Isso se explica através do hábito, porque já fazíamos isso há algum tempo. Dizemos, portanto, que há uma predisposição natural do cérebro em criar hábitos para poupar energia e economizar esforços.
Neurocientistas descobriram que pacientes com lesões nos gânglios basais cerebrais eram incapazes de reconhecer expressões faciais, como o medo e o nojo. Eles simplesmente não sabiam em qual parte do rosto deveriam focar para compreenderem as expressões. Assim concluímos que: sem os gânglios basais perdemos acesso às centenas de hábitos dos quais dependemos todos os dias. Com isso, não conseguiríamos tomar decisões corriqueiras, como decidir se devemos escovar os dentes antes ou depois do banho. Note que esse é um processo que se torna um hábito, sobre o qual não precisamos mais pensar a respeito dele.
Sabendo disso, chegamos a um dilema: assim como temos hábitos bons, temos também hábitos ruins, sendo incorporados ao nosso dia a dia. O que pode ser visto no padrão de comer fast food, cuja prática começa sendo mensal, se torna semanal, depois, aumenta, para duas (ou mais) vezes por semana. Nessa toada, não pense que a aparência padronizada da lanchonete e dos produtos McDonald’s ou que suas batatas fritas, projetadas para se desintegrarem ao contato imediato com a língua fornecendo sal e gordura, o mais rápido possível, para as nossas papilas gustativas, foram escolhidos ao acaso. Ao contrário, foram feitos estrategicamente, com base em uma série de deixas e recompensas, que estabelece hábitos que passam a governar o nosso comportamento. Mas, como desconhecemos o momento que esses loops de hábitos se surgem em nossas vidas, não sabemos da nossa capacidade para controlá-los.
Pois bem, caro leitor. Diante de tudo isso, eis que surge a questão: o que devemos fazer para substituirmos os hábitos ruins? A resposta envolve a criação de novos hábitos e rotinas diferentes que venham satisfazer os anseios que, outrora, motivaram a formação dos hábitos ruins, mesmo em momentos de grande estresse. Tenha em mente que esse será um trabalho árduo que exigirá grande esforço e, algumas vezes, grande força de vontade.
Duhigg (2012) considera que hábitos angulares são aqueles que desencadeiam uma série de reações no modo com que as pessoas organizam as suas rotinas. Um exemplo clássico disso é: o exercício físico e como a sua prática regular pode deflagrar mudanças em diversas áreas de nossas vidas. Essas mudanças podem implicar em uma alimentação mais balanceada, menor consumo do tabaco ou, até mesmo, abandono do tabagismo, resultando em mais disposição para realizar outras tarefas. Com efeito, podemos compreender, ainda, como a prática de exercício físico pode influenciar a saúde bucal ou o desempenho escolar dos nossos alunos. Nesse sentido, importa saber: quais hábitos angulares podem ser despertados em nossos pacientes ou alunos?
É interessante sabermos que a força de vontade pode também se tornar um hábito que despertará maior capacidade de enfrentamento de adversidades. Mas, como usar isso em prol da educação formativa, quando estamos ensinando nossos alunos na Odontologia? Esse tema é demasiadamente amplo e voltaremos, futuramente, a falar mais sobre ele. Fiquemos, por hora, com alguns trabalhos experimentais que mostram que os estudantes quando tratados com gentileza e respeito, desenvolvem maior força de vontade para enfrentar obstáculos, diante de uma situação desconhecida, como na prática clínica, por exemplo. O mesmo se aplica para todas as nossas relações interpessoais. Creio que, nós, profissionais de Odontologia e/ou professores, deveríamos pensar mais sobre tudo isso!
Vale destacar que mudanças de hábitos angulares podem desencadear novas práticas em grandes corporações empresariais ou, ainda, despertar movimentos sociais. Para aqueles que queiram entender melhor a questão, o autor apresenta outros exemplos interessantes, como o caso do supermercado Target, nos EUA, que parece adivinhar o que você deseja, antes mesmo que você saiba disso!
Por último, aproveitando o tema, sugerimos que você incorpore a leitura na sua rotina. Basta começar e você, logo, perceberá que esse “hábito angular” pode trazer uma série de mudanças para a sua vida!
Leitura Complementar:
1- Dughigg C. O Poder do Hábito. Por que fazemos o que fazemos na vida e nos negócios. Schwarcz: Rio de Janeiro, 2012, 1 ed.
* Charles Duhigg fez parte da equipe de repórteres do New York Times e foi vencedor do Prêmio Pulitzer de 2013.