Autoavaliação e Pós-Graduação
Existe um movimento crescente sobre a autoavaliação na Pós-Graduação e os seus impactos no sistema de avaliação, cujo desdobramento ocorre tanto na CAPES como nas universidades. Nesse post, proponho apresentar algumas reflexões que possam contribuir com a discussão da temática, buscando instigar a produção de mais material sobre o assunto e promover mudanças em nossas práticas!
Assim, a primeira pergunta que eu me faço é: por que precisamos fazer a autoavaliação?
Bom, em primeiro lugar, a autoavaliação deve ser vista como um conjunto de estratégias que nortearão mudanças nos Programas de Pós-graduação. Para que isso aconteça, o olhar externo não deve ser o único balizador, mas uma das ferramentas de diagnóstico utilizadas pelo Programa. A autoavaliação, portanto, é um olhar crítico e reflexivo, fundamental para a construção de novas políticas. Em outras palavras, ela não deve ser pensada como uma política de melhoria do conceito do Programa, nem deve ser feita como se estivéssemos preenchendo um check-list que busca apontar a nossa excelência. Na realidade, a autoavaliação não é feita para o outro, mas para nós mesmos, já que resulta em autoanálise, embora ajude também no reconhecimento que teremos pelos nossos pares.
Em segundo lugar, racionalizo: como deve ser feita a autoavaliação?
Em geral, não existem regras para buscarmos respostas que estão dentro das nossas práticas. Mas, percebo que precisamos escutar mais aqueles que estão envolvidos nos processos. Ou seja, devemos estar mais atentos ao nosso papel como formador de recursos humanos.
Se por um lado, a autoavaliação combina com maturidade e autocrítica, já que pressupõe que todos os atores encontrem nela um espaço convidativo à participação. De outra parte, ela deve ser contínua e sem hierarquias. Embora, muitas vezes, seja dolorosa, pode trazer também mudanças importantes para o cumprimento da missão dos Programas de Pós-Graduação. Nesse quesito, cabe uma ressalva: verificar se todos os envolvidos que fazem parte de um Programa de Pós-Graduação conhecem, de fato, a sua missão. Afinal, como cumpriremos nossa missão, sem conhecê-la?
Além disso, entendo que em uma autoavaliação, os sujeitos envolvidos (coordenadores, colegiados, professores e técnicos) devem ter a ciência de que a análise crítica do nosso principal “cliente”, corpo discente, poderá, em muitos casos, gerar desconforto. Mas, é importante saber que isso faz parte do processo. Afinal, o empoderamento discente não deve ser somente respeitado, mas também estimulado. Não é fácil conhecer exatamente o que o outro acha do nosso trabalho, embora possa ser altamente enriquecedor!
Igualmente, considero importante ressaltar que a avaliação de orientadores é fundamental para entendermos a trajetória de um programa de Pós-graduação e isso não pode estar limitado somente ao nosso olhar sobre os egressos, mas também sobre o olhar deles a respeito do nosso Programa e de nós, orientadores. Assim sendo, já é um bom começo se conseguirmos verificar: Quais são as ações dos nossos Programas que buscam conhecer saber mais sobre isso?
Por último, me pergunto: o meu Programa está fazendo uma autoavaliação profunda?
Caro leitor, para responder essa pergunta, eu levanto outra questão: Quais mudanças ocorreram realmente no meu Programa que foram resultantes do processo de autoavaliação? Particularmente, considero que conhecer estes dados, não é apenas abrir portas para a discussão do movimento, mas, de fato, valorizá-lo.
Como exposto ao longo deste post, acredito que a autoavaliação não deve ser para apaziguar a nossa consciência sobre aquilo que fazemos de melhor. Na verdade, eu entendo que o ideal seria que ela focalizasse aquilo que precisamos melhorar ou, até mesmo, nos aspectos que precisamos deixar para romper com antigos hábitos. Considero também que a nossa prática de ensino não deve ser somente sobre aquilo que temos de melhor, mas sobre o que os nossos alunos demandam. Afinal, o nosso Programa existe para eles!
Portanto, reitero que ela [autoavaliação] deve trazer mudanças. Avaliar um Programa, em razão das suas transformações e seus efeitos sobre os nossos alunos já é um bom começo. E, se por ventura, essas não existirem, provavelmente, falhamos na nossa análise crítica sobre aquilo que fazemos!
Outro aspecto importante ainda é avaliar: Será que os nossos critérios de credenciamento respondem às demandas de nossos estudantes? Embora essa pergunta deva-nos acompanhar sempre, quando definimos o nosso corpo docente, é preciso saber, nitidamente, em quais momentos ela faz parte de nossas decisões.
Por último, para retratar a importância de nossos estudantes nessa missão, convido vocês a lerem o livro: “The Rise of Univerisities”, de Charles Homer Haskins. Na oportunidade, aproveito para destacar uma passagem que relata a experiência da Universidade de Bolonha, a mais antiga, em 1088:
“Os estudantes de Bolonha inicialmente organizaram a universidade como uma forma de proteção contra a população urbana; já que os preços, dos quartos e das mercadorias indispensáveis, aumentaram com a multidão de inquilinos e consumidores. Unidos, os estudantes podiam impor as suas condições à cidade, valendo-se da ameaça de abandoná-la juntos. Isso era possível porque as universidades não tinham edifícios próprios e, portanto, eram livres para partir. Há, inclusive, exemplos históricos desse tipo de migração. Vitoriosos sobre os habitantes das cidades, os estudantes viraram-se contra os seus outros inimigos, os professores. Os professores eram obrigados a viver de acordo com um minucioso conjunto de regulamentos que asseguravam o valor do dinheiro pago por cada estudante. Se um professor não conseguisse uma audiência de cinco alunos para uma preleção regular, ele era multado como se estive ausente – certamente seria uma aula muito inferior a que não conseguisse cinco ouvintes!”
Bolonha era, portanto, uma universidade de estudantes e criamos, com o tempo, a academia que acabou com tudo isso.
Diante disso, devemos aprender com a história e compreender que a nossa origem não está nos prédios, mas em quem os ocupa!
Conclusão
Assim, encerro esta breve reflexão, dizendo que a autoavaliação nos aproxima da nossa missão mais importante: contribuir para a formação de jovens lideranças e que não devem ser espelhos de nós mesmos!
Leitura complementar:
1- Haskins CH. The Rise of Universities. Cornell University Press, 1957.